Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados,
Dia 15 de outubro comemorou-se mais um dia do professor. Novamente, como em todos os anos, vindas desta tribuna e das tribunas dos Parlamentos estaduais, municipais e do Senado Federal, ecoaram vozes comemorativas e verdadeiramente gratas pela contribuição inestimável dada aos filhos deste País pelos homens e mulheres que abraçam a docência como profissão, por gosto e por vocação. Pelo trabalho, a dedicação, a ética e – por que não? – a utopia do conhecimento, do progresso e da cidadania que nossos professores buscam dia a dia fazer introjetar em cada estudante, em cada novo cidadão brasileiro, só podemos mesmo agradecer.
E é por isso que inicio minha fala com um agradecimento breve, porém sincero: obrigado, professores, por fazerem seus os nossos filhos, ensinando-lhes o abismo que separa virtude e vício, certo e errado, atraso e progresso, dando-lhes carinho e afeição, combinados a disciplina, respeito e humildade; aproximando-os por fim, com ética e seriedade, do incomensurável patrimônio intelectual que a humanidade tem produzido e acumulado desde a noite dos tempos para seu próprio benefício e para beneficio do planeta.
Por redundante que pareça, Sr. Presidente, é imprescindível afirmar e reafirmar, agora e sempre: sem professores não há civilização. Por isso, aproveito o pouco tempo que tenho para expressar minha gratidão de homem público, de pai e de estudante. Obrigado, professores, muito obrigado!
Mas não vim aqui, Sr. Presidente, apenas relembrar o que não deve ser esquecido por qualquer sociedade. Vim, igualmente, cobrar do Governo Federal, do Presidente Lula, do Ministro Paulo Bernardo e do Ministro Fernando Haddad, o envio urgente a esta Casa de uma proposta de reajuste salarial para os docentes federais do País – professores e pesquisadores das Universidades Federais, dos CETEFEs e das Escolas Técnicas Federais, dos Colégios de Aplicação e do Colégio Pedro II.
É inominável a situação salarial dos docentes federais brasileiros. Inominável, Sr. Presidente! Uma breve olhada no Boletim Estatístico de Pessoal, divulgado regularmente pelo Ministério do Planejamento, mostra quão inferior é o salário dos docentes relativamente aos demais servidores públicos federais. Os professores que atuam na educação básica têm vencimentos que variam de R$1.542,47 (para graduados em início de carreira) a R$3.814,55 (para doutores em final de carreira). Os que atuam no nível superior – os professores universitários, aqueles que respondem pela mais expressiva parcela da produção científica e tecnológica do País – pasmem, ganham entre R$1.650,27 e R$5.131,49 por mês.
Pois bem, Sr. Presidente, R$5.131, 49 é o que ganha um professor doutor titular em nossas universidades federais, para uma jornada de 40 horas de trabalho semanais dedicadas ao ensino, à pesquisa e à extensão. R$5.131,49! Isto, Sr. Presidente, é menos do que ganham todos os demais servidores federais atuantes na área de pesquisa com a mesma titulação e, em muitos casos, com titulação até inferior ao doutorado.
Ao final da carreira, se possuir doutorado, um especialista da FIOCRUZ tem vencimento de R$9.298,06; um técnico de planejamento e pesquisa do IPEA, R$11.325,09; um pesquisador-tecnologista em Informações e Avaliações Educacionais do INEP, R$7.380,16; um especialista sênior em Propriedade Intelectual do INPI, R$11.392,07; um pesquisador em Propriedade Intelectual do INPI, R$10.361,88; um pesquisador em Informações Geográficas e Estatísticas do IBGE, R$8.552,00; um especialista em Metrologia e Qualidade Sênior do INMETRO, R$11.392,07; um pesquisador-tecnologista e analista executivo em Metrologia e Qualidade do INMETRO, R$10.361,88; e um professor titular, que fez um concurso público para ingressar na carreira regular e outro ao término da progressão funcional, R$5.131,49. Como eu havia dito: inominável!
Inominável e injustificável, Sr. Presidente. Porque, diferentemente dos mais de 2 milhões de professores atuantes na educação básica nos âmbitos estadual e municipal – para os quais esta Casa, enfim, decidiu-se a votar um piso salarial nacional – os docentes federais somam pouco mais de 115 mil trabalhadores, não havendo, portanto, a desculpa de que a categoria é numerosa demais para que sejam viáveis reajustes salariais relevantes. Se o Governo encontra recursos para viabilizar as carreiras de mais de 250 mil servidores de nível superior, todos com salário inicial superior ao pago aos docentes graduados, como se justifica que para a educação, para o professor, o pesquisador, o pensador não haja recursos? Como se justifica, Sr. Presidente, que o Estado brasileiro, no âmbito da Comissão de Valores Mobiliários, pague um salário inicial de R$2. 268,66 a um auxiliar de serviços gerais e, nas escolas de educação básica federais, um professor ingresse na carreira ganhando R$1.542, 47 e se aposente, como doutor, com salário de R$3.814,55? Como podem os servidores de nível auxiliar da Imprensa Nacional ingressarem na carreira com vencimentos de R$3.335,87 e um professor universitário, graduado, ingressar com R$1.650,27 e egressar, doutor, se titular, com pouco mais de 5 mil reais? Como, Sr. Presidente, como?
E antes que alguns colegas me aparteiem, argumentando que a maior parte das carreiras do Executivo possui vencimentos subvalorizados e que a comparação pode dar a impressão de que todos os servidores públicos federais, com exceção dos professores, ganham muito bem, eu quero dizer que as comparações que faço são justamente para mostrar como, mesmo no âmbito do Executivo, onde sabidamente muitas carreiras são defasadas relativamente aos demais Poderes, os professores federais são injustificavelmente mal remunerados. Note, Sr. Presidente, que aqui não comparto os vencimentos dos professores com os de procuradores ou magistrados, mas com os de outros pesquisadores doutores e, inclusive, profissionais de nível educacional inferior.
E faço essa comparação, Sr. Presidente, apenas para mostrar o irrealismo da situação salarial dos docentes que atuam no âmbito federal no Brasil, sem me ater aqui à verdadeira indecência que são os salários dos professores na maior parte dos Estados e municípios do País. Aqui ao lado, no Município de Águas Lindas de Goiás, Entorno do Distrito Federal, um edital para concurso público de servidores municipais exibia, sem o menor pudor, a seguinte relação cargo/salário para uma jornada de 40 horas: mestre-de-obras, escolaridade mínima, ensino fundamental incompleto, salário: R$800,00; operador de máquinas, escolaridade mínima, ensino fundamental incompleto, salário: R$900,00; professor da educação básica, escolaridade mínima, curso superior de licenciatura plena ou normal superior, salário: R$760,00.
Isso, Sr. Presidente, em um mesmo edital onde todos os demais cargos de nível superior, sem exceção, tinham salários de R$2.000,00. Um pedagogo, um nutricionista, um turismólogo em Águas Lindas de Goiás ganham da Prefeitura Municipal R$2.000,00 de salário para 40 horas de trabalho, mas um professor, com nível superior, para as mesmas 40 horas, ganha o ridículo de R$760,00, menos que um mestre-de-obras ou um operador de máquinas. Inominável!
Muito se diz que em matéria educacional salário não é garantia de qualidade. De fato, se pensarmos em uma relação linear simplória entre salário e qualidade do trabalho, é evidente que a assertiva será verdadeira. Mas se pensarmos que o salário é atrativo de mão-de-obra, podemos ver por que as carreiras burocráticas de alto vencimento, cuja exigência para ingresso é apenas o ensino médio ou a graduação de nível superior, vêm atraindo cada vez mais profissionais de alta formação acadêmica – em inúmeros casos, pessoas com perfil profissional e vocação não burocrática -, enquanto as escolas e universidades têm que contar com o interesse sacerdotal de alguns poucos vocacionados para a ciência e o ensino. É evidente que o salário interfere na qualidade da educação! Quanto menos atrativa for a universidade ou a escola para os profissionais de alta formação acadêmica tanto menos eles ingressarão em seus quadros.
A iniciativa de expansão da rede de CETEFEs e de universidades, com interiorização de campi e escolas em cidades pólo, é, ao lado da experiência dos CIEPs, uma das mais meritórias já realizadas em nosso País em matéria educacional. Jamais tantas escolas técnicas e tantas novas salas de aula no ensino superior foram criadas a uma só vez no Brasil, sem que se concentrassem unicamente nas capitais e nas grandes cidades. Hoje, pela primeira vez, as cidades médias e, por conseguinte, as cidades pequenas em sua área de influência – vale dizer, quase 90% de nossas cidades – podem contar com educação técnica e superior pública e gratuita, coisa jamais vista. É preciso reconhecer o esforço que o Governo Federal vem fazendo no sentido de democratizar o ensino, aproximando-o de sua real demanda, que se espalha por todo o território nacional e não apenas pelas capitais federais.
Mas isso não significa olvidar ou admitir a situação salarial de nossos professores. É preciso lembrar aos Ministros da área econômica que não há nação desenvolvida, civilizada, soberana e sustentável sem investimento em educação, ciência e tecnologia. E esse investimento não pode ser apenas em expansão das vagas no ensino, mas também em pagamento de salários decentes aos professores. Só assim será possível evitar a fuga de talentos da área educacional-científica para a burocracia, o mercado ou mesmo outros países. Não é possível que os pesquisadores das universidades federais ganhem a metade do que ganha um pesquisador do IPEA, do INPI, do INMETRO ou do IBGE; tampouco que um professor da educação básica ganhe menos que um mestre-de-obras ou um operador de máquinas.
É preciso trazer os salários dos docentes das universidades federais – que além de professores são também pesquisadores e extensionistas – ao mesmo nível dos salários pagos nos melhores e mais bem remunerados centros de pesquisa do País e elevar o salário dos professores graduados a, no mínimo, o nível salarial dos demais servidores públicos com igual formação educacional. É preciso ter vontade política, coragem e compromisso com a Nação. Chega de discriminar os professores e depois subir às tribunas dos Parlamentos para lhes prestar homenagens. Se queremos homenagear nossos professores, então o façamos de verdade, traduzindo nosso reconhecimento social em salários decentes.