Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, aproveito a oportunidade em que nesta Casa homenageamos o Dia Mundial do Coração, comemorando igualmente os 25 anos da Fundação Zerbini/INCOR e os 60 anos da Sociedade Brasileira de Cardiologia, para lançar uma reflexão a respeito do espaço que vem sendo ocupado pelos problemas cardíacos no mundo atual e para discutir nosso papel social na prevenção e no tratamento desses males do coração.
Há no mundo milhões de pessoas que morrem todos os anos vítimas de problemas cardíacos. No Brasil país em que a primeira causa de morte é o coração , registram-se anualmente mais de 200 mil mortos.
Não há dúvida de que as cardiopatias são um verdadeiro flagelo mundial e nacional que precisa ser urgentemente combatido. Mas esse combate, por surpreendente que possa parecer, uma vez que sua base se encontra na prevenção e não na cura, não é de modo algum uma tarefa fácil. Isso porque o que se esconde por trás das terríveis estatísticas de mortalidade por causas do coração não é algo que está sob o domínio pleno e exclusivo de médicos e especialistas em saúde. As cardiopatias que conduzem tantas pessoas à morte não são uma questão biológica isolada, mas sim um problema complexo, sanitário e cultural, um problema típico da moderna civilização. No caso brasileiro, a coisa ganha ainda maior gravidade porque a civilização moderna, produtora endógena de cardiopatas, irmana-se aqui a uma sociedade desigual, de capitalismo tardio e periférico, e a escassez material, o desamparo social e a violência generalizada dão a tônica de uma vida coletiva frenética, desequilibrada e perigosamente temerosa.
É importante dizer que os corações humanos não são atualmente mais frágeis ou necessariamente mais doentes do que os de nossos antepassados. O que temos hoje, razão primeira de tantas cardiopatias, é um estilo de vida amplamente comprometedor de nossa saúde cardíaca. Por força das necessidades de trabalho e das condições espaciais e de transporte de nossas cidades, somos compelidos a um ritmo de vida paradoxalmente acelerado e sedentário. Vivemos correndo de um lado para o outro, sempre preocupados com questões de trabalho, dinheiro, estudo, temendo a violência, o desemprego e outros “fantasmas”. No bojo dessa “louca vida” não encontramos tempo, espaço e, muitas vezes, sequer dinheiro para nos alimentarmos, descansarmos ou nos exercitarmos corretamente. Vivemos de lanches, comidas rápidas ou alimentos industrializados repletos de gorduras e carentes de nutrientes. Comemos quando o tempo do trabalho e não do organismo nos autoriza a tanto, e o fazemos em pé, sempre com pressa, sempre preocupados. Dormimos não quando temos sono ou cansaço, mas somente quando as obrigações nos permitem. Quando, enfim, temos direito ao descanso, no pouco tempo que nos sobra entre tantas coisas a fazer, não nos resta muita energia para as atividades físicas. Preferimos o repouso absoluto, e assim nos entregamos à perigosa cultura do sedentarismo. Muitos de nós, vítimas da indústria da morte, somamos a isso tudo o vício do tabaco, verdadeiro veneno para a circulação humana e o coração.
Diante desse quadro conturbado, não há, de fato, como evitar que as doenças do coração vitimem tantas e tantas pessoas, ano após ano.
Como sociedade, e não apenas como indivíduos isolados e incomunicáveis, devemos assumir a tarefa de construir uma nova experiência social, em que a vida de cada um e a vida de todos tenham valor supremo e a saúde não seja mera oposição à doença, mas sim uma riqueza em si mesma.
Como dito, Sr. Presidente, senhoras e senhores, essa não é uma tarefa fácil para uma sociedade de capitalismo voraz como a nossa, onde parte da população sucumbe aos tormentos da mais absoluta exclusão fome, desnutrição, contaminações decorrentes da ausência de saneamento básico e de saúde pública preventiva , enquanto outra parte padece justamente dos males advindos da inclusão em uma modernidade anômala, imperfeita, tardia e parasitária da saúde humana e aí falo de infortúnios como a obesidade, o tabagismo, o estresse e o sedentarismo.
É preciso que a luta pela saúde cardíaca no Brasil seja também uma luta pela inclusão social em um modelo de sociedade que possa superar as imperfeições e os desequilíbrios de nossa sociedade atual. Nosso desafio é justamente construir, no corpo do sistema capitalista global que todos sabemos se fundamenta em valores como o desperdício, a competição e a desigualdade , uma sociedade mais justa e equilibrada para todos, que não negue a seus filhos o direito ao trabalho e à inclusão, mas que o faça assegurando igualmente qualidade de vida e saúde. Nosso desafio moderno é, pois, conciliar as exigências do capital com as necessidades do corpo. Não se trata somente de “consciência”, mas igualmente de condições sociais e econômicas favoráveis a que os cuidados com a saúde e a vida sobreponham-se em investimento e importância aos cuidados com a doença ou a morte.
Para concluir, Sr. Presidente, senhoras e senhores, quero falar da fortuna que é para uma nação deficitária, mas promissora como a nossa possuir um conjunto de especialistas tão devotadamente comprometidos com a construção desse novo amanhã para nossa saúde cardíaca. Falo aqui dos homens e das mulheres que formam e dignificam essas duas instituições, verdadeiros patrimônios da saúde nacional: Sociedade Brasileira de Cardiologia e Fundação Zerbini, reconhecido instituto médico de pesquisa, prevenção e tratamento das patologias do coração.
Vendo as vitórias que os cardiologistas brasileiros têm conseguido ao longo de anos de luta em favor de corações saudáveis penso aqui nos sucessos alcançados pelas campanhas de prevenção, nos transplantes, nas pesquisas de ponta , sentimo-nos tanto orgulhosos quanto confiantes de que não sonhamos sozinhos com um outro amanhã para o Brasil. Reconhecemos, com tranqüilidade, que nossa luta pela construção desse novo futuro encontra-se ao amparo de grandes brasileiros e brasileiras, médicos e pesquisadores, verdadeiros idealistas que, com seu trabalho e competência, vêm transformando para melhor o triste quadro da saúde cardíaca brasileira.
Parabéns, senhores, pelo trabalho.
Obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Walter Fe